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A importância do vínculo mãe e bebê.

Hoje sabe-se que o feto é possuidor de percepções, tanto do mundo exterior, quanto do universo interno que compõe o corpo materno, demonstra sensações de prazer e desprazer, tem sensibilidade e apresenta traços rudimentares de personalidade, que possivelmente formados mediante fatos ocorridos antes do nascimento.





Abordar o tema da maternidade e do vínculo mãe-filho é relevante para a ampliação dos conhecimentos dentro do campo da Psicanalise, principalmente quando lançamos um olhar, para a formação intrauterina do bebê, a relação do vínculo afetivo mãe-bebê, e a formação do psiquismo. Transformações históricas mudaram o papel da mulher na sociedade, que apesar da maior demonstração de afeto, muitas mães e pais ainda vivenciam dificuldades no desempenho de seus papéis, especialmente no que se refere à conciliação entre sua função de autoridade e sua função de provedores afetivos. O presente artigo pretende focar a relação mãe-filho, realizando uma reflexão sobre os fatores que influenciam a formação do vínculo afetivo entre ambos, considerando as mudanças históricas a respeito do papel materno, os períodos críticos para a formação do vínculo, desde a gravidez até os primeiros dias de vida da criança, bem como uma reflexão sobre a transmissão psíquica entre gerações, a fim de melhor compreender a influência da história de vida materna na estruturação do vínculo com seu filho



O Primeiro Vínculo

Os vínculos afetivos são objetos de estudos em diferentes vertentes na psicanálise, psicologia, filosofia, na biologia e em outras linhas de pensamentos, afinal somos todos frutos de um de vínculo, sendo ele afetivo, ou não.

O ser humano é desde seu nascimento, frágil e dependente de cuidados de outro ser humano. Precisamos de um vínculo para sobreviver. Alguém precisa cuidar das necessidades básicas do novo ser, que vão desde a parte orgânica com a necessidade de ser nutrido, limpo, protegido, até a parte mais emocional, de nutrir nossos sentidos com cores, aromas, sabores, temperatura, espaço, dor e prazer. Somos seres sociais, e para tal precisamos do outro para sobreviver e aprender a viver de fato.

Freud se dedicou durante muitos anos a desvendar a construção do aparelho psíquico, tentando entender como a forma como está construção é feita, afeta a cada sujeito. Com seu olhar de médico, iniciou sua observação estudando toda parte biológica de cada paciente e daí ele desenvolve a primeira etapa do seu trabalho que ele intitulou a Metapsicologia. Vivendo no início do século, Freud volta seus estudos para fase oral, após o nascimento do bebe, e desenvolve boa parte da sua teoria a partir destas observações clinicas, oriundas da fala de seus pacientes

Com o avanço da medicina e com um novo olhar da psicanálise as patologias que começaram a surgir na clínica, voltou-se o interesse e a pesquisa para uma fase anterior ao nascimento; a fase intrauterina, e um novo mundo se abre para pesquisa científica na formação e desenvolvimento do feto.

O estudo da psicologia pré-natal, tem interesse na influência das emoções maternas, sejam elas positivas ou destrutivas, sob o desenvolvimento físico e emocional do feto. De acordo com Quayle (2011) e Zenidarci (2010), uma mãe sob forte tensão emocional, tende a apresentar alterações hormonais que ultrapassam a barreira placentária e ocasionam alterações no equilíbrio psicofisiológico fetal. O cordão umbilical, elo de ligação, por onde surge a inter-relação física e emocional entre mãe e filho. Os primeiros contatos com o meio externo são sentidos e vivenciados, através das reações emocionais da mãe, frente ao que ela pensa, sente e vivencia. Com isso, alterações neurais, hormonais e humorais da mãe, devido a alguma perturbação emocional, são levadas ao feto pelo cordão umbilical agindo diretamente no seu estado emocional, registrando assim marcas em seu psiquismo que serão decisivas na sua formação psicoemocional.

Aqui é importante destacar, que havendo um pai/parceiro (a), junto a relação, é de suma importância no processo emocional a formação de uma tríade vincular, que irá marcar a forma como este feto-bebe, irá se expressar ao mundo durante o seu processo de existência, visto que registros mnêmicos, guardados no inconsciente, exercem influência no psiquismo do ser humano em sua vida pós-natal. Entende-se então que, estes registros, quando traumáticos, podem auxiliar na compreensão de psicopatologias de origem primitiva, ou seja, parte-se do entendimento de que quanto mais precoce a falha, falta ou trauma, mais grave será a psicopatologia.

Além de tomar consciência da separação de seu filho, o nascimento é o momento em que surgirá a criança, um rosto, um som, antes um filho em potencial, que passa a ter um estatuto de sujeito de direito e o status de pessoa.

Winnicott (1988) ressalta que cada bebê é desde o começo uma pessoa, necessitando ser conhecida por alguém, e que ninguém pode conhecer melhor um bebê que a própria mãe. Em uma via de reciprocidade, o bebê também aprende rápido a interpretar a mãe, por isso é considerado ativo no processo de vinculação, à medida que suas capacidades de ver, ouvir e se mover, provocam respostas na mãe, iniciando interações recíprocas (NÓBREGA, 2005). Vemos a complexidade e a profundidade no âmbito da formação do vínculo entre mãe e filho. É uma construção vincular, que perpassa por todos os nossos sentidos, envolvendo olhares, cheiros, toque, alimentação, além da comunicação de inconsciente para inconsciente, desde a geração do feto.



Este processo de identificação com o bebê foi muito bem descrito por Winnicott (1983) que o denominou de "preocupação materna primária", descrita como uma sensibilidade que faz a mãe perceber e suprir as necessidades de seu filho, lançando as bases de sua saúde mental, processo este essencial, uma vez que o bebê experimenta angústias muito fortes nos estágios iniciais do desenvolvimento emocional, antes que seus sentidos estejam organizados e seu ego desenvolvido. É em virtude desta dependência do bebê que Bowlby afirma que "a mãe, nos primeiros anos de vida da criança, funciona como sua personalidade e consciência" (2006 b, p.55). No mesmo sentido, Bion (apud ZIMERMAN, 2010) usou a expressão "relação continente-conteúdo" para expressar a capacidade da mãe de acolher e processar as angústias, anseios, medos, necessidades e desejos de seu filho.


Winnicott (1988) usa o termo "mãe devotada comum" para designar aquela mãe que, naturalmente, se adapta de forma sensível e ativa às necessidades do bebê, que no início são absolutas. O rumo do desenvolvimento, porém, deve percorrer um estágio de dependência absoluta, rumando para a dependência relativa e culminando na independência, que nunca será absoluta. Em estado saudável, o indivíduo nunca está isolado, mas preserva uma interdependência com o ambiente. A criança, no estágio de dependência absoluta, acredita que o mundo é criação sua, mas ao atingir outros estágios, deve viver um processo de "desilusionamento", facilitado pela mãe, à medida que esta permite um contato cada vez maior do bebê com a realidade. Porém, esta desilusão deve ocorrer apenas depois da mãe ter proporcionado ao bebê uma crença nas coisas e nas pessoas, um sentimento de confiança básica, característico do desenvolvimento saudável.


A relação mãe-filho pode, entretanto, ser patológica, quando, por exemplo, gera problemas de fusão. Se a mãe, ou a pessoa que desempenha este papel, tiver sido uma criança carente em sua história inicial, terá dificuldade em cuidar sozinha de seu bebê, da mesma maneira que ela ainda precisa ser cuidada, em virtude de um sentimento de desamparo, caracterizando o que ressalta Winnicott (1988) como o confronto de desamparos.


Outra situação possivelmente indicadora de fusão patológica é a amamentação prolongada. Quando prolongada, pode indicar que a mãe permanece num estado de fusão com a criança, impossibilitada de reconhecer a alteridade de seu filho, o que terá consequências sobre o seu desenvolvimento (SZEJER e STEWART, 1997).


Num extremo, a perda de interesse pela criança prejudica sua saúde emocional, aumentando o risco de doenças, desnutrição ou retardo no desenvolvimento. As dificuldades maternas podem ser decorrentes da existência de transtornos psíquicos como a ansiedade e a depressão pós-parto, gerando para o bebê, na visão de Winnicott (1988), uma experiência de desintegração. O bebê foge destas sensações de desintegração que a experiência de distanciamento materno suscita, se recolhendo em si mesmo ou desenvolvendo um "falso self", que surge em virtude da necessidade de agradar a mãe. Ao invés de viver a experiência da criatividade e da espontaneidade, entrando em contato com sua essência, a criança desenvolve a capacidade de reconhecer qual o desejo da mãe em relação a ela e, assim, se submete aos seus desejos.




Do imaginário ao Real

Tendo como objeto de estudo o inconsciente, a Psicanálise vem a campo por meio de diferentes psicanalistas, trazendo um olhar para essa fase de formação da vida intrauterina.

“Se considerarmos que todos os fatos que ocorrem no período pré-natal recebem registro mnêmico; que esse registro se dá e fica guardado apenas no nível do inconsciente; que todas as vivências pelas quais passa o ser humano, no período pré-natal irão fazer parte de sua bagagem inconsciente, exercendo influência tanto sobre a personalidade pós-natal como sobre sua conduta e seu comportamento; e sendo o inconsciente o objeto por excelência da Psicanálise, conclui-se que o estudo do psiquismo pré-natal é de importância fundamental para esse campo de conhecimento” Wilheim (2000, p.136).


Diferentes estudos realizados, comprovam que é no período pré-natal que se inicia a capacidade de aprendizado do bebê que, mesmo antes de nascer, já é um ser inteligente e sensível.

A prática clínica da psicanálise, tem flagrado, segundo Wilheim, evidências de registros traumáticos, pertencentes ao período pré-natal e ao nascimento, que perduram durante todo percurso de vida do sujeito. Um ponto importante a ser observado, é que com o avanço da medicina, a ultrassonografia, traz a luz a percepção de um filho imaginário para um filho real. Afinal, antes do advento da técnica exploratória a mãe mantinha em seu universo imaginativo, a forma e as feições do futuro filho, e hoje ao poder observar em 4D, com profunda clareza, o feto que se desenvolve, essa mãe lança mão desse imaginário e cai na concretude do real. A forma com o ela irá manejar as expectativas e frustrações despertadas por tal encontro vão depender da sua história prévia, seus conflitos psíquicos, seu momento atual de vida e sua capacidade de elaboração.

Portanto todo processo gestacional, as influências do mundo exterior e as expectativas conscientes e inconscientes mãe em relação ao futuro filho, influenciam na formação psíquica do feto.







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